sábado, 22 de dezembro de 2012

[Resenha #23] Um Grito de Amor do Centro do Mundo, de Kyoichi Katayama

Quem nunca ouviu o conselho para se aproveitar a vida ao máximo enquanto se pode, pois, quando menos se esperar, tudo poderá ter chegado ao fim? Nós humanos somos feitos para negar a consciência da morte - ficaríamos loucos se o nosso cérebro não desse algum jeito de omitir esse fato de nossa percepção. Em um minuto, tudo pode estar bem; em outro, tudo poderá estar desmoronando. Kyoichi Katayama confere ao casal desafortunado de sua obra a difícil tarefa de mostrar ao leitor que a morte é um realidade derradeira, mas passível de reflexão e compreensão. Conheça a difícil trajetória de Aki e Sakutarô em "Um grito de amor do centro do mundo".



Sakutarô é ainda um garoto quando conhece Aki na escola em que estuda, numa cidadezinha japonesa. Ela é bela, inteligente e popular, e logo se tornam amigos inseparáveis. Mas, conforme Sakutarô amadurece, ele começa a ver em Aki mais do que apenas uma amiga. Em pouco tempo, sua relação se transforma numa paixão arrebatadora. Os adolescentes trocam juras de amor; prometem nunca mais se separar. Mas uma tragédia fará com que o destino de ambos seja irremediavelmente alterado. Um grito de amor do centro do mundo é um dos romances japoneses mais lidos de todos os tempos. Foi adaptado para o cinema e para uma série de TV, além de ter se tornado um mangá de sucesso no Japão.



"Um Grito de amor do Centro do Mundo" é considerada a obra mais vendida em todo o Japão, e não é para menos. Com um enredo emocionante e repleto de um sentimento constante de tristeza, a obra de caráter reflexivo aborda a crueldade da morte precoce e o sofrimento daquele que permanece vivo. A narrativa é bem característica do comportamento oriental, há muito disso implícito na obra, como, por exemplo, a sutileza ao tratar dos sentimentos e o tradicional comportamento - julgados pelos ocidentais como introspectivo - da cultura japonesa.

A verossimilhança da obra é incrível, não floreia em qualquer momento o relacionamento entre o casal - Sakutarô e Aki - sempre abordando as inseguranças bem comuns em um primeiro relacionamento. Ambos os personagens, se analisados, podem ainda serem imbuídos de um caráter alegórico - Saku age passionalmente a várias situações, representando a Emoção; enquanto Aki, por geralmente possuir uma sobriedade racional,  é a clara representante da Razão.

Devo avisar que o fato de eu citar a morte de Aki não é categorizado como um "Spoiler", pois isso já é dito logo na primeira página do romance - fato que choca ao leitor logo de início, uma vez que romances trágicos como esse espera suas últimas páginas para revelar o fatídico destino de seus personagens. Essa surpresa, já intriga o leitor, uma vez que a curiosidade é aguçada em relação do que poderá prendê-lo na história, uma vez que já é visto que o romance não terá um final feliz.

(KYOICHI KATAYAMA)
As personagens, para transferir tanta carga emocional, devem ser bem construída - e é o que justamente ocorre com os protagonistas da obra. O psicológico de Aki não é nem um pouco floreado ou maquiado durante a fase de sua doença. Ela não é uma personagem extremamente otimista ou pessimista, na realidade, ela é uma garota fragilizada por uma doença terrível que desperta medos e inseguranças, ainda que ela lute para encontrar esperanças.


Saku perde a capacidade de viver, perde muito de sua sanidade. Na verdade, é perceptível como o jovem morreu no mesmo dia que Aki - ele se torna apenas uma casca, age por reflexo e instinto diante de qualquer interação social. Na 4ª Parte do Romance, notamos que a narrativa torna-se mais densa e muito mais descritiva. Os diálogos são praticamente abolidos - sinal da total introspecção de Sakutarô após a tragédia que o acometeu. O jovem passa a abandonar e renegar a sua existência no mundo exterior e passa a aceitar seu próprio mundo interior como sua principal realidade.

"Senti medo de fazer uma única escolha entre inúmeras possibilidades. esse medo era justificado porque somente o que se escolhe é que se torna realidade; o resto desaparece."

A reflexão da obra em relação de como a humanidade lida com sentimentos tão profundos e os mistérios que envolvem a morte é fenomenal.A todo instante os personagens fazem analogias pertinentes, tentando desbravar o que poderá ser encontrado após o fim.  Afinal, o que há além? Nada ou, simplesmente, tudo? Há algum tempo atrás, em um consultório médico, li uma crônica que retratava um "diálogo" entre dois fetos antes do nascimento, discutindo qual seria o destino deles após os 9 meses de gestação; um acreditava em uma nova vida, o outro era cético, dizia que o nada (ou o fim) era o que os esperava - isso não soa como uma conversa entre dois adultos discutindo sobre o que encontrarão após a morte?

"uns dizem que no final só existe o 'nada'; mas mesmo essas pessoas não podem, de fato, comprovar o que dizem. A morte era isso."

Aki é uma garota frágil, insegura. Soou clichê? Bem, diferente das adolescentes que já estamos cansados de aturar nas ficções juvenis, Aki consegue cativar o leitor justamente através dessas características - é uma garota que deseja mais do que tudo aparentar ter forças, mas não consegue esconder seu defeitos da pessoa que lhe é mais importante: Saku. Talvez seja o fato da doença de Aki ter tido um desenvolvimento mais interessante na minissérie asiática que me fez achar a carga dramática dos momentos vividos pela "Aki literária" mais suaves - mesmo que ainda muito tristes. O autor quis mostrar mais a força do relacionamento de Saku e Aki - os dilemas que o jovem casal teve de enfrentar - do que focar na comoção dada pela doença de Aki. Além disso, a parte do hotel da ilha Yumejima, na adaptação televisiva, é muito menos sugestiva do que nas páginas do livro - vejo que pelo menos na literatura japonesa, não há tantas tentativas de encobrir assuntos sexuais com receios e pudores. 

A minissérie pode ser encontrada em diversos sites especializados com o nome original japonês "Sekai chuushin de ai wo sakebu". Você poderá conerir algumas cenas marcantes presentes no livro e na adaptação logo no fim desta resenha.

É interessante como o autor mantém o leitor preso à história mesmo com o fato do casal já ter sua história fadada a uma tragédia. Um ponto negativo da obra se encontra  em sua narrativa temporal. Muitas vezes o leitor não sabe ao certo se esta revivendo uma memória, um delírio ou a realidade atual de Saku. Também é visto que há alguns diálogos que não funcionam muito bem em português,e é perceptível o esforço da tradutora em algumas passagens que, com certeza, transmitem mais emoção no original japonês.


"Temos tudo; não nos falta nada. É por isso que não vejo sentido em pedir a Deus o que nos falta, ou buscar essas coisas num mudo após a morte. Afinal de contas, temos tudo aqui. Por isso, acho que o mais importante não é pedir, mas saber encontrar o que queremos."

A Alfaguara traz uma edição bem interessante aos leitores. Com uma capa bem trabalhada e com efeito interessantes, chamam a atenção de curiosos. As páginas são amarelas, fazendo os olhos de qualquer leitor agradecerem. O livro possui no total 4 capítulos,  que eu acredito serem mais tomados como "partes", e diversas subdivisões demarcadas em uma contagem crescente. Erros gramaticais são praticamente nulos. Todas essas características tornam a edição uma das mais bem construídas e a leitura muito confortável.

"Um Grito de amor do centro do mundo", como o próprio título diz, é o clamor da necessidade das pessoas analisarem o tratamento que dão umas as outras, o quanto é necessário que você ame intensamente aquele que lhes são queridos enquanto você ainda tem a oportunidade de tê-los por perto. O mundo contemporâneo arrancou a compaixão dos homens, pois esses julgam que a maior carga de trabalho lhe trarão uma felicidade palpável futura. Mera ilusão, pois o motivo de nós sorrirmos, sempre é e será outra pessoa.



Título: Um Grito de Amor do Centro do Mundo      AutorKyoichi Katayama  

Editora: Alfaguara

Notas: |Enredo: 07/10 | Edição: 09/10Entusiasmo:06/10| 

11 comentários:

  1. Olá ^^ conheci seu blog pelo skoob, enfim amei a resenha até tenho o livro mais ñ tinha me animado pra ler.
    Acho maravilhoso quando são lançados no Brasil livros que venham lá do oriente principalmente do Nihon (Japão) e da Coréia.
    Realmente como vc ressaltou a personalidadde introspectiva é uma caracteristica marcante nos japoneses. Mesmo assim eu os admiro muito.

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    1. Sim, também acho fantástico quando encontro literatura oriental pela livraria. rss
      Ainda não li nenhum coreano, ninguém nunca me recomendou algum (ou nunca vi mesmo)
      Espero que a resenha possa ter despertado um pouco mais de vontade em você de ler o livro ;]
      Obrigado pela visita! Espero que volte sempre!

      Beijos,
      Lucas

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Sou louca para ler esse livro!
    Depois dessa resenha já sei o que se pode esperar, me deixando mais cativa para ler *-*
    Adorei o modo que você escreveu a resenha, enfim, adorei aqui e já estou seguindo \o/
    Beijo*

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    1. Muito obrigado pelos elogios, Bruna!
      Fico muito feliz que tenha despertando mais interesse pelo livro em você! É uma obra realmente diferente do que nós estamos acostumado a ver por aí nas livrarias. Se você não tiver nenhum preconceito com entretenimento asiático, sugiro que procure a minissérie baseada no livro: Sekai chuushin de ai wo sakebu. Foi uma das melhores séries que já vi.

      Mais uma vez obrigado!
      Volte sempre ;]

      Beijos,
      Lucas

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  4. Amei a resenha, eu vi esse livro no skoob e me apaixonei, vou lê-lo em 2013 :)
    beijos

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    1. Lola!
      O meu caso só foi um pouco diferente. Eu já havia visto a minissérie japonesa baseada no livro (que até àquela época não sabia se tratar de uma adaptação). Descobri justamente através do skoob, também!
      Quando vi o livro na Bienal desse ano, não tive dúvidas e levei pra casa. Foi uma ótima compra. =]
      Espero que possa lê-lo em breve e volte pra compartilhar sua impressões também ;]

      Beijos,
      Lucas

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  5. Eu lembro que eu resolvi ler esse livro só por causa de uma frase que eu vi em um blog, mas como nunca encontrava ele na livraria daqui acabei deixando pra lá.
    Sua resenha me deixou muito curiosa, já vou continuar a minha busca.

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    1. Hmm... é realmente complicado achar livros assim em livrarias. Ainda mais se for em livraria pequenas. Já tentou dar uma procurada pelas lojas virtuais (Saraiva, Submarino)? Tenho certeza que você não irá se arrepender de lê-lo; apesar de ser um livro bem diferente, ele realmente transmite alguma coisa. Aliás, posso perguntar qual seria essa frase? rss

      Beijos,
      Lucas

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  6. Hey adorei o blog!!!
    A seleção de obras pra resenha realmente se adequa muito ao meu gosto!
    Parabéns!!!!

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    1. Obrigado!Fico muito feliz! =]
      Espero que possamos nos ver por aqui mais vezes! =D

      Beijos,
      Lucas

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